A poucos dias da Semana Internacional do Jerez, que em 2023 acontece entre os dias 06 e 12 de novembro, aproveitamos a passagem pelo Brasil de Jan Pettersen, para descobrir um pouco mais sobre o fascinante universo do Jerez.
Jan, um apaixonado pelo vinho Jerez é proprietário e diretor de exportação da Bodegas Rey Fernando de Castilla. Com este nome nórdico, não é difícil perceber que não é uma pessoa natural do sul da Espanha, terra produtora desse vinho único.
Nascido na Noruega, Jan chegou a Jerez depois de completar os seus estudos em Barcelona em 1983. Depois de muitos anos trabalhando na gigante Osborne, ele próprio admitiu que não foi um amor à primeira vista! O sabor único e o estilo oxidativo do Jerez podem fazer com que as pessoas levem algum tempo para se acostumar com seu caráter, mas garanto, que se permitir persistir não será difícil aprender a apreciá-lo como nenhum outro.
VINICOLA – A história do vinho Jerez é digna de um filme de cinema! Suas primeiras parreiras foram plantadas em torno do ano 1.100 a.C., uma cultura que sobreviveu ao domínio de povos diversos – inclusive mulçumanos que não permitem o consumo de álcool. São mais de 3 mil anos de produção ininterrupta, é isso? Como isso foi possível?
JAN – Os fenícios descobriram que o terroir da região de Jerez era extraordinário para a produção de vinho. O clima é quente, mas amenizado pela proximidade do Oceano Atlântico. As terras calcárias, “Albariza”, que há milhares de anos foram cobertas pelo oceano e os vinhos do oeste e do leste fazem do Jerez um vinho único e inimitável. A área foi importante para a produção de vinho também na época em que gregos e romanos ali estiveram. A partir do ano 711 com a ocupação muçulmana, a produção diminuiu, mas os governadores permitiram que os cristãos que viviam na região consumissem vinho. No século XIII, quando a zona foi reconquistada pelo reino de Castila y Leon, o esplendor dos vinhos Jerez regressou e no século XV já era famoso em todo o mundo. Deve-se notar que Colombo em sua primeira viagem à América levou numerosos barris de Vinho Jerez.
VINICOLA – Depois de tantos anos na Osborne, em que momento o Sr. percebeu que era hora de ter a sua própria Bodega?
JAN – Durante os meus 16 anos na Osborne descobri a singularidade e a enorme qualidade dos vinhos Jerez. Tornei-me um “romântico do vinho Jerez”. No final dos anos 90, Osborne decidiu sair do negócio do Jerez e do Vinho do Porto. Isso me fez procurar uma empresa de vinhos Jerez de alta qualidade para continuar trabalhando com esses vinhos. A oportunidade surgiu com a vinícola Rey Fernando de Castilla, que era muito pequena, mas tinha uma reputação fantástica.
VINICOLA – Quando decidiu investir, o Sr. chegou a considerar vinícolas tradicionais de vinhos tranquilos ou uma bodega de Jerez sempre foi a única opção?
JAN – Desde o início estava determinado a apostar nos vinhos Jerez e nos brandies, embora também estivesse interessado em explorar possibilidades de fazer outros vinhos aqui na região de Jerez, e participei na fundação de uma bodega de vinhos tintos e brancos tranquilos aqui, a Bodegas Huerta de Albala. Depois de algum tempo me aposentei deste projeto para focar exclusivamente no desenvolvimento da vinícola Rey Fernando de Castilla, que hoje se tornou um dos principais produtores de produtos de qualidade da região.
VINICOLA – Por que a escolha pela Bodegas Fernando de Castilla? Como foi que o Sr. chegou até essa propriedade?
JAN – Bodegas Rey Fernando de Castilla era uma pequena empresa, focada exclusivamente na produção de vinhos, brandies e vinagre de Jerez de primeira qualidade. A empresa tinha uma boa posição no mercado espanhol, mas era praticamente desconhecida fora de Espanha. A internacionalização da marca foi uma grande oportunidade, e hoje exportamos 85% da nossa produção para 53 países. Também era importante que a empresa tivesse as mais belas bodegas no centro de Jerez de la Frontera e instalações perfeitas para a produção e envelhecimento dos produtos.
VINICOLA – O Sr. teve um papel essencial na região ajudando a recuperar a reputação de produção e envelhecimento do Jerez Fino, não misturado e não tratado. Como que o produto de baixa qualidade, de épocas anteriores, pode ter interferido na evolução de mercado do Jerez?
JAN – Desde a década de 1960 que o Jerez é um mercado “duplo”, oferecendo produtos de excelência para consumidores exigentes, mas as grandes adegas também produzem produtos de qualidade inferior e a preços baixos, para os mercados anglo-saxônicos. Por isso, tem sido importante para Fernando de Castilla diferenciar-se do mundo dos vinhos inferiores e oferecer apenas produtos de qualidade distribuídos nas melhores lojas e restaurantes do mundo. Não trabalhamos com grandes redes de supermercados e não fabricamos produtos de marca branca para terceiros.
VINICOLA – Apesar de ser um vinho tão versátil e particular, o consumo de Jerez ainda é muito tímido. O paladar do brasileiro é pouco familiarizado com o Jerez. Essa é uma realidade pontual ou o mercado internacional também tem dificuldades em entender o Jerez?
JAN – O consumo de vinhos Jerez no Brasil é certamente limitado, mas observamos um crescimento estável e nossos vinhos são conhecidos por especialistas e consumidores com muito interesse em vinhos de qualidade. Os grandes vinhos Jerez devem ser consumidos combinados com alimentos. O Jerez é um dos vinhos mais valiosos que existem hoje. Da entrada à sobremesa, na comida ou nos cocktails, demonstra a sua capacidade de oferecer novas sensações e combinações.
Em todo o mundo vemos que os consumidores, mesmo os relativamente jovens, têm descoberto o que os vinhos Jerez podem oferecer na gastronomia. De fato, o consumo de vinhos tradicionais como Fino, Amontillado, Oloroso ou Pedro Ximenez aumenta ano após ano.
VINICOLA – Qual seria a melhor harmonização para os estilos diversos de Jerez?
JAN – Fino e Manzanilla combinam maravilhosamente com marisco, peixe, saladas e embutidos como o presunto ibérico. Mas também fica incrível com outros alimentos como salmão defumado ou sushi.
Amontillado e Palo Cortado combinam com caldos, cremes e sopas. Também acompanha pratos de cogumelos, carnes brancas ou vegetais como alcachofras ou aspargos.
Oloroso é muito utilizado com ensopados de carne, patês ou queijos curados. Também combina com carnes de caça e carnes vermelhas.
Acredito que o grande desafio no universo do vinho é torná-lo popular entre os jovens. Para vocês, este é um desafio? Seria talvez a coquetelaria o melhor caminho para popularizar o consumo de Jerez entre os mais jovens?
JAN – Há cada vez mais jovens interessados em gastronomia e vinhos. Nós produtores de vinho Jerez temos que participar de eventos, degustações e estar presentes nos meios digitais para convidar os consumidores a experimentar os nossos produtos. Muitos jovens conhecem o Jerez através do “spritz”, onde o Jerez é combinado com refrigerantes e hortelã como o “Rebujito” que representa um consumo muito importante em Espanha e outros países.
VINICOLA – Estamos próximos da Sherry Week de 2023, a Semana Internacional do Jerez. Quais são as ações que vocês estão preparando para esta semana dedicada aos apaixonados por Jerez?
JAN – Nossos produtos estarão presentes em diversas atividades ao redor do mundo durante a semana do Jerez. Acho que também no Brasil. Na própria adega teremos um “pop up” de um ótimo restaurante da zona que oferecerá harmonizações dos nossos vinhos com pratos de atum.
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