Jesús Marino Pascual é um dos principais nomes da arquitetura especializado em projetos para o setor vinícola da Espanha. Conhecido pela ousadia e pela influência futurista de seus projetos, J. Marino, que possui uma filial do seu escritório no Brasil, esteve no país em outubro, para uma série de palestras e pararealizar um estudo de uma vinícola em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul.

“Não podemos tratar de vender um bom vinho se os espaços em que são elaborados não são de qualidade e não cumprem com seu papel “

VINICOLA – Qual é a sua principal preocupação quando vai projetar uma vinícola?

J.MARINO PASCUAL – As preocupações são muitas. Seguramente tantas quanto as ilusões.
A vinícola é um centro de elaboração que soma complexidades diversas, por um lado tem que basear-se em uma concepção rigorosa, cômoda e funcional e de tal maneira que o trabalho na vinícola seja eficiente e produtivo. Por outro lado, a construção de uma vinícola demanda características muito especiais, mas sobretudo deve ser termicamente estável e, por isso, ao conceber uma vinícola com determinadas partes sob o solo, melhorará a qualidade de seus vinhos.
Por último, a vinícola de hoje converteu-se em um lugar de interesse cultural e isso faz com que apareça um novo protagonista no programa de organização funcional: o visitante. Ao qual deve-se tratar como merece e por isso a vinícola tem que oferecer todos os serviços que este visitante-turista requer.

VINICOLA – Na sua opinião, quão importante é o papel da arquitetura para o enoturismo?

J.MARINO PASCUAL – Acredito que é determinante.
Não podemos tratar de vender um bom vinho se os espaços em que são elaborados não são de qualidade e não cumprem com seu papel, por outro lado, a vinícola na paisagem do vinhedo é um componente de seu cenário e por isso é evidente a necessária qualidade de sua arquitetura como peça simbólica em harmonia com seu entorno e a paisagem. Da mesma maneira os espaços internos devem possuir as qualidades necessárias para conseguir, além de sua funcionalidade, seu valor cenográfico que leve o visitante  ao estado emotivo para viver uma experiência que está vinculada inevitavelmente com os sentidos.

“A arquitetura, em definitivo, também é resultado construído de nossa cultura e que acumula toda a história do conhecimento humano “

VINICOLA – A Espanha ditou uma tendência de introduzir no cenário do vinho uma arquitetura mais moderna. A que se deve esta mudança?

J.MARINO PASCUAL – Efetivamente se desenvolveu nestas últimas décadas uma arquitetura a altura dos vinhos que se produzem e nos casos mais destacados, melhorando também a qualidade dos vinhos.
A arquitetura, em definitivo, também é resultado construído de nossa cultura e que acumula toda a história do conhecimento humano.

VINICOLA – Devemos esperar para o futuro um pouco menos de estilo de “Chateaux franceses” e mais arquiteturas modernas e grandiosas no universo do vinho?

J.MARINO PASCUAL – Não sei se mais grandiosas, mas sim, cada vez melhores vinícolas e quando digo melhores, quero dizer de boa arquitetura, que é definido na primeira pergunta e sempre comprometidas com seu tempo.
Porém não resulta ridículo que uma vinícola tenha esse tipo de ornamento que nada tem a ver com a elaboração do vinho e com nosso tempo?
A história nos ensina e por isso seguimos colocando-as sob a terra para manter o equilíbrio térmico e diminuir o custo energético e disso nos apropriamos, porque consideramos um ensinamento transcendental, porém temos que ser sinceros e evitar a retórica gratuita.

VINICOLA – Conte um pouco sobre como foi desenvolver o projeto do Museu da Cultura do Vinho Dinastía Vivanco.

J.MARINO PASCUAL – Me pede algo muito difícil de resumir em algumas poucas frases.  Existe um livro que descreve todo o processo em que eu participo de maneira ativa, porém foi uma experiência verdadeiramente singular: um grande bodegueiro que quer colocar ao desfrute público as diversas coleções que adquiriu desde muito jovem e assim que terminou sua carreira de enólogo.  Foi uma grande gestação, pois o projeto iniciou 1996 e terminou a obra com a montagem expositiva em 2004. Foi inaugurado pelo Rei Juan Carlos I  e hoje está catalogado como o melhor museu do vinho do mundo pela UNESCO.  A importância que este museu teve na nova concepção de enoturismo de qualidade é inquestionável.

VINICOLA – Há algum projeto que você nutra um carinho mais especial?

J.MARINO PASCUAL – Vivemos os projetos com paixão e sua construção com emoção.
É muito apaixonante ver algo que surgiu da conexão de quatro (ou quatro milhões) de neurônios, depositados com um lápis em um papel, tornando-se um grande conjunto construído e real.
Asseguro que o próximo projeto, todavia será esse.

VINICOLA – Como você vê a realidade brasileira no cenário do vinho? Tende a seguir uma linha mais moderna ou mais conservadora? Podemos esperar esse cenário futurista no Brasil?

J.MARINO PASCUAL – O melhor do Brasil é a aspiração de ser um país de seu tempo e de não renunciar sua personalidade.
Seu clima singular também oferece singulares e diferentes vinhos e a progressão em investigação e sistemas de elaboração dão seus frutos.
Me surpreendi com o desejo de superação e os progressos nos seus vinhedos, em suas vinícolas e em seus vinhos.
Ninguém que queira progredir pode fechar os olhos ao futuro, bem ao contrário, deve abri-los e olhar com audácia.
O futuro não chega sozinho e estamos colaborando aqui no Brasil em alguns projetos cujos proprietários estão nesta linha e sem dúvida o salto qualitativo é e será grande.

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